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domingo, 16 de março de 2014

AI 5 DIGITAL: Marco Civil da Internet

Nem todo mundo sabe, mas está em elaboração um projeto de lei que pretende regulamentar o uso da Internet no Brasil, O Marco Civil da Internet. O projeto, lançado em 29 de outubro de 2009,  é uma parceria entre a Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça (SAL/MJ), e Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getulio Vargas (DIREITO RIO).
O projeto de lei tem logo de cara uma inovação, a construção colaborativa, através da Internet, do chamado Marco Regulatório Civil da Internet Brasileira. Nele você pode comentar os artigos do projeto, dando sua opinião e participando de sua construção.
De fato, a primeira vista o projeto vem ajudar a dar mais poder aos Internautas, e regular os serviços de Internet. Mas eu sou daqueles que se arrepia quando se fala em regulamentar qualquer coisa que seja ligada a liberdade de expressão e a privacidade do cidadão. Não sei porquê sou tão arredio com projetos deste tipo. Talvez porquê nasci durante a ditadura militar no Brasil, ou porquê presenciei amigos e professores sumirem da faculdade, e da face da terra, pois tinham escrito algo sobre o regime militar, ou porquê cresci vendo a importância da liberdade de imprensa e do poder da liberdade de expressão que criou o país que conhecemos hoje.  Nasci no inferno da censura, e ví a liberdade nascer e crescer, diante dos meus olhos, alimentada por homens e mulheres, cuja coragem em se expressar, salvaram nossa nação e seus jovens, de um futuro incerto.
É fácil para quem nasceu livre, podendo escrever no Orkut o que bem entende, e podendo falar mal de um político em seu blog, achar exagero este papo todo de preocupação com a liberdade de expressão. Mas acredite, só valorizamos aquilo que nos falta. E para mim a liberdade é um bem inegociável.
Mas vamos a uma análise objetiva do que está acontecendo com a Internet brasileira, e como isso vai afetar para sempre as mídias sociais, o marketing digital, as redes sociais, e a sua vida. Sim, a sua vida, pois por enquanto, você que está lendo livremente este blog. Sem medo ou preocupação.

A regulamentação da Internet


Muitos países tem se preocupado em regulamentar a Internet. Os provedores, empresas de telecomunicações e prestadores de serviços tem usado  a desregulamentação na Internet para abusar dos consumidores. Nos Estados Unidos as empresas tem manipulado a velocidade de acesso para inibir usuários que baixam muitos vídeos e músicas. No Brasil as empresas de telecom, tem artificialmente mudado a prioridade e o roteamento dos pacotes de Voip, como o Skype, para piorar a conexão e garantir que o usuário use o celular ou o telefone convencional. O Google, tem usado e vendido informações sobre o perfil de acesso dos usuários para fins de publicidade.
Assim criar um marco regulatório parece importante para defender a liberdade de expressão na Internet, o direito do consumidor, e o direito a privacidade do cidadão. É neste sentido que o documento avança, e tem contribuições importantes, defendendo o Internauta em boa parte de seu texto, colocando regras claras para defender o consumidor, e atribuindo a devida relevância à Internet na política pública.
O marco civil se preocupa em colocar com clareza questões como a guarda das informações de conexão, fundamentais para as investigações sobre cyberbullying, golpes e demais crimes cibernéticos. Ele defende também o nosso direito a não ter as informações de acesso guardadas pelos provedores a nossa revelia, e defende a liberdade de expressão e o direito de privacidade.
O documento é muito feliz em ressaltar o papel do estado como incentivador do uso da Internet, como agente de integração do cidadão na rede, como guardião da liberdade de uso da Internet, e como responsável maior em capacitar a população, em particular a de baixa renda, no seu uso. O texto fala ainda na necessidade de criar uma política pública para inserir a Internet no ensino regular, nas escolas de todos os níveis, garantindo que ela faça parte do programa  regular de todas as disciplinas.
Outro mérito está no fato de se tratar da primeira lei colaborativa, criada e discutida a partir da Internet, no formato de blog, e com participação aberta a todos. Assim, sugiro que você se cadastre, leia o Marco Regulatório Civil da Internet Brasileira e colabore com seus comentários.
Mas o problema com marcos regulatórios que afetam coisas tão sensíveis como a Internet, é que eles podem, a pretexto de ações tão nobres , criar um monstro ainda pior : A Censura.

A censura na Internet brasileira

O marco civil da Internet se torna um problema quando tenta legislar sobre a remoção de conteúdo na Seção IV. Eu consigo entender a origem desta seção, pois a equipe deve ter pensado no problema do cyberbullying, e tomado o ofendido, a pessoa atacada por uma notícia ou foto falsa nas mídias sociais, como um cidadão de bem. É verdade que algumas pessoas estão sofrendo ao verem seus nomes, fotos e histórias, envolvidas em tramas horrorosas, sendo difamadas por colegas de escola, ou ex-namorados ciumentos. Para isso criaram a seção IV, que fala sobre como o ofendido e o provedor devem agir. Nestes casos, removendo, sem a necessidade de um processo na justiça, o conteúdo do maledicente.  Até aqui você deve ter achado tudo bacana e bem pensado. Vamos proteger os pobres coitados, ofendidos por malvados malfeitores cibernéticos. Mas é aí que mora o perigo.
O Marco Civil da Internet peca ao não considerar todos os agentes da sociedade interessados em limitar o direito de expressão dos blogs e mídias sociais. A seção IV do Marco Civil da Internet fala de remoção de conteúdo, e tenta dar ao provedor, a responsabilidade e o poder, de remover um conteúdo, pela simples notificação de um reclamante.
Para alguns pode parecer uma boa idéia, mas isso permitiria que qualquer empresas, denunciada por um consumidor insatisfeito, qualquer orgão público, denunciado por um cidadão por abuso de poder, ou qualquer político, afetado por uma denúncia de corrupção, se coloque como parte ofendida e force o provedor a retirar o conteúdo. Na prática isso é censura. Na prática isso limita o meu e o seu direito de se expressar na Internet.
O Marco Civil da Internet, que começa como um bom documento de defesa dos cidadão e de valorização da Internet, encontra na seção IV uma forma artificial, equivocada e perigosa de, para defender o abuso de uns poucos, dar poder demais aos provedores de acesso ou hospedagem, e permitir que se remova um conteúdo sem julgamento e sem direito de defesa.
Pelo artigo IV, bastaria a LOCAWEB reclamar e notificar a ela própria, para que meu artigo sobre a demissão de seu diretor comercial fosse retirado do ar, sem que eu pudesse dizer nada. Só podendo me manifestar depois da retirada, e tendo que provar que não ofendi ninguém. Na prática o provedor virá polícia, juiz e prisão.
Imagine então o ReclameAqui, a maioria das empresas poderiam alegar que estão sendo ofendidas pelas reclamações dos consumidores que lá escrevem, e o provedor de hospedagem removeria todo o conteúdo do site.
A questão é que não se pode simplificar um tema tão sério. Todos nós temos o direito a defesa e a um julgamento justo antes de sermos afetados pela pena. E quem faz isso em uma sociedade democrática é o poder judiciário. Isso é básico para a liberdade. Você pode até se perguntar : Mas isso não demora muito? Não. Existem ações liminares e cautelares que permitem que uma real ofensa a alguém seja retirada na justiça. Além disso, quem fez a ofensa vai pagar caro, muito caro, na justiça. Mas só depois de se defender e ser condenado. Impedir o judiciário de agir, e entregar este poder a uma empresa privada, só porque ela hospeda o Twitter, o Orkut ou meu Blog, é recriar a censura, ou melhor, censurar a Internet.
A seção IV coloca o provedor como o responsável pela ofensa, caso ele não atenda ao ofendido. Isso na prática faz com que o provedor sempre seja compelido a agir tirando o conteúdo. Uma festa da censura. Se ele não retira o conteúdo, e o ofendido estiver certo, ele é responsável e paga solidariamente com o dono do conteúdo supostamente ofensivo. Agora, se ele retira o conteúdo, e depois de muita briga e tempo, se mostra que o conteúdo não era de fato mentiroso, ou ofensivo, nada acontece. Niugém tem que indenisar o dono do conteúdo, atingido pela censura prévia. Assim fica óbvio que ele sempre agirá removendo e bloqueando qualquer conteúdo denunciado. Sem pensar duas vezes. As empresas que não atendem bem o consumidor, os funcionários públicos de abusam do cidadão, e os políticos corruptos, agradecem a brilhante ideia, e vão usar constantemente este mecanismo para pressionar a todos que quiserem escrever algo contra eles.
Este é o problema. Uma seção mal escrita que compromete todo o documento, e criar uma contradição típica dos ditadores : Para defender a liberdade vamos limitá-la.
A única coisa inútil neste momento é reclamar depois. Só pela participação ativa nos processos colaborativos, democráticos, e políticos é que é possível criar um futuro melhor. A omissão e a apatia são péssimos companheiros.
Sugiro que você acesse o Marco Regulatório Civil da Internet Brasileira se cadastre, leia e colabore com seus comentários. Tire suas próprias conclusões e depois volte aqui para fazer seus comentários.
Sugiro também que envie este post para seus amigos, e que eles também acessem o Marco Regulatório Civil da Internet Brasileira e participem.



Fonte: http://www.claudiotorres.com.br/ 

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